IR. GENARINA GECCHELLE
22/09/1910 + 17/06/1977Biografia
Como Abraão, Irmã Genarina recebeu de Deus a vocação missionária: “Deixa tua terra, tua família, a casa de teu pai, e vai para a terra que eu te mostrarei” (Gn 12,1).
Foi assim que, respondendo ao chamado de Deus, ela veio para o Brasil, em 1938. Passou por diversos Hospitais, tendo iniciado suas atividades no Pequeno Príncipe, em Curitiba, lá permanecendo de 1938 a 1957, prestando serviços de enfermagem pediátrica.
Em 1957, foi transferida para o Estado de São Paulo, exercendo suas atividades nas cidades: São Paulo (capital), Bauru, Araraquara e Adamantina, sempre junto às crianças, na Pediatria. Além dos cuidados físicos, preocupava-se com dar às crianças, a ela confiadas, o conhecimento de Deus, de Jesus, toda informação espiritual a elas acessível nessa idade e preparava-as para a Primeira Eucaristia. Sua dedicação pelas crianças era invejável; porém, nem sempre podia fazer por elas tudo quanto desejava, não descuidando o que estava ao seu alcance.
Os desígnios de Deus são insondáveis, e os planos de Deus sobre nós, são mistérios. Assim, Ir. Genarina, num ofertório contínuo doou sua vida a Deus e ao próximo vivendo o que o próprio Cristo disse: “Tudo que fizerdes ao menor dos meus irmãos, a mim o fazeis.” (Mt 5, 40).
Após intenso trabalho, sentia suas forças se enfraquecerem e, acometida de um câncer ósseo, sentia chegar seu fim. Consciente do seu mal acreditava e esperava dias melhores, não desejava morrer logo; porém, percebendo a gravidade do seu mal, aceitou, plenamente e com muita tranquilidade, a vontade do Pai.“Quem teme o Senhor sentir-se-á bem no instante derradeiro, no dia da morte será abençoado” (Ecl 1,13). Sim, este é, realmente, o retrato de Ir. Genarina, pois, antes da morte, acompanhou todas as orações da Sagrada Unção; rezou e cantou com a comunidade das Apóstolas que a cercavam o “Magnificat”, com voz clara e forte, e parecia dizer com São Paulo: “Para mim o viver é Cristo, e o morrer é lucro” (Fl 1,21). E, mais: “Estou pronta a ser imolada e o instante da minha libertação se aproxima” – “Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé. Resta-me agora receber a coroa de justiça que o Senhor, justo Juiz, me dará naquele dia.” ( II Tim 4,6-8).
Assim, no dia 17 de junho de 1977, festa do Sagrado Coração de Jesus, Ir. Genarina entregou sua alma a Deus, na Santa Casa de Adamantina/SP, local do seu trabalho como Apóstola. Contava 67 anos de idade, 45 de vida religiosa e 39 anos de Brasil. Sua morte foi invejável, serena, tranquila. Acreditamos que, junto ao Sagrado Coração de Jesus e Madre Clélia, ela intercede por nós e, sabemos que, ao se desfazer a tenda que habitamos neste mundo, receberemos uma casa preparada por Deus, uma habitação eterna, no céu. Após a Santa Missa concelebrada por dois sacerdotes, foi transladada para Marília/SP e sepultada na Capela São José, junto à Betânia.
Depoimentos
Ir. Cleamaria Simões - “No ano em que moramos juntas, na Comunidade de Adamantina, em 1976, Ir. Genarina, sempre se dedicou aos cuidados das crianças doentes da Pediatria. Era de um relacionamento agradável, expansiva. Previa se aproximar o dia eterno para o qual se preparou muito bem; a sua fé não se deixou abalar; estava já entregue ao que Deus dela desejasse”.
Ir. Maria de Lourdes Pontoglio - O próprio Padre Batista contou-me que quando Irmã Genarina trabalhou na Santa Casa em Araraquara/SP Apóstola ardente e evangelizadora que era, costumava preparar as crianças para a primeira Eucaristia. Certa vez chegou ele um garoto negro, pobre e doente, preparou-o para a primeira comunhão e percebendo que era inteligente, esperto, manifestava o desejo de ser Padre, dedicou-lhe atenção especial e encaminhou-o para a escola. Posteriormente, o Batista ingressou no Seminário e ela o acompanhou com orações, sacrifícios e fazendo trabalhos, que vendia e com o dinheiro ajudava-o nos estudos e livros. Batista foi ordenado Padre por Dom Evaristo Arns e mais tarde foi Cura da Catedral da Sé, em São Paulo. Disse-me que desejava ir a Marília para celebrar a Santa Missa no túmulo de sua protetora, porém, isso não se concretizou, porque ele faleceu logo depois.
Irmã Gertrudes Pereira - Morei muitos anos com Irmã Genarina e por isso posso falar de sua vida de Apóstola exemplar. Sofreu com muita paciência sua enfermidade, um câncer. Passou por várias cirurgias, mas quando se sentia um pouco melhor, recomeçava seu trabalho. Era muito devota do Sagrado Coração de Jesus e de Maria; praticava as virtudes de Madre Clélia e a imitava na oração e no sofrimento. À noite, preparava adultos para o Batismo, primeira eucaristia e para o casamento, especialmente os japoneses que moravam em Adamantina/SP. Nos recreios sempre alegre, transmitindo a todas o contentamento por ser Apóstola e poder fazer muita gente feliz.
Era muito amiga dos médicos e funcionários. Em 1977, ela me disse: “vou morrer na festa do Coração de Jesus”, que seria dia 17 de junho. Isto muito me marcou. Nessa época já não tinha muita disposição, porém, continuava seu trabalho, um dia melhor, outro pior, de nada reclamando e agradecida por tudo que faziam por ela. No dia 16 de junho ela me disse, apontando para o céu: “amanhã eu vou”. Quis despedir-se dos médicos que a tratavam, agradeceu, e um deles disse: já que a senhora diz que vai amanhã, reserve um lugar para mim. Levamos tudo na brincadeira, mas achamos por bem chamar o Padre para administrar-lhe os santos sacramentos. À noite as Irmãs do Colégio vieram visitá-la, cantaram, tocaram violão e ela pediu que cantassem “Jesus amável...” e o “Magnificat” em agradecimento pela sua vocação; rezou, agradeceu à Congregação, a família e aos amigos. Na manhã seguinte, dia 17, as Irmãs cuidaram da higiene pessoal dela, pois, estava acamada. Ela continuava alegre, brincando e sorrindo. Às 7h45 já estava junto de Deus. Sentimos sua ausência e agradecemos a Deus por nos ter proporcionado convivência tão especial, nossa querida Ir. Genarina.
Ir. Elidia Pegoraro - Tive a felicidade de gozar por vários anos da companhia da Ir. Genarina. Sempre admirei sua bondade, humildade, caridade e delicadeza. Dizia sempre que o Coração de Jesus era seu eterno namorado. Zelava para torná-lo conhecido e amado, aproveitando toda oportunidade para propagar sua devoção. Sua paixão era a catequese para os doentes, crianças da pediatria e principalmente para as famílias japonesas. Sempre alegre, animada, gostava de fazer brincadeiras; muito honesta e comunicativa; desprendida de tudo, quando recebia algum presente deixava à disposição de quem necessitasse; amava os pobres e necessitados e tratava a todos com muita atenção. Nos últimos dias de vida, sentindo muitas dores, dizia estar entregue nas mãos do Coração de Jesus e repetia estou pronta se ele quiser vir me buscar. Rezava muito, era realmente de profunda oração. Conheci Irmã Genarina quando eu era aspirante em Curitiba/PR. Ela trabalhava com as crianças doentes no Hospital César Perneta e eu morava no Colégio.
Ir. Genarina era de aspecto enérgico e até inspirava medo, porém, na realidade era muito caridosa; pude constatar isto quando precisei de seus serviços de enfermagem. Agiu como Jesus, curando as feridas, aconselhando-me, ensinando-me e incentivando-me a continuar na vida religiosa, oferecendo tudo a Jesus pela salvação das almas. Com as crianças era maternal, acolhedora, afável, ensinando e incentivando a oração e ao amor de Jesus e Maria. Sempre quis o bem de todos, funcionários e médicos com quem trabalhava; era humilde e dedicada; deixou marcas de seu amor a Jesus (Pronunciamento de 14/8/1994).
Era robusta, de caráter enérgico e firme. De espírito evangelizador e missionário; tomava conta de nossa espiritualidade. Possuía uma formação humanitária profunda. Eu a conheci no Hospital das Crianças, quando aí permaneci abandonada por meus tios. Ir. Genarina foi quem, com amor e carinho, cuidou de mim e deu-me um padrinho, Dr. Osvaldo e madrinha Dona Maria Helena Faria da Costa. Preparou-me para o batismo, pois eu não sabia o que era isso. Preparou-me também para a primeira comunhão. Eu a considero minha mãe espiritual. Nesse espaço de tempo ia-me falando sobre vocação e perguntando-me se queria ser Irmã. Eu não lhe dizia nada, porque nada entendia de ser irmã. Nunca tinha visto freira em minha vida. Só sei que nessas conversas ia observando que ela era bonita, boazinha e me queria bem. Achava bonito o vestido dela, comprido e todo branquinho. Isso me empolgou tanto que no dia de minha primeira comunhão eu fiquei de vestido comprido o dia todo, pois queria me parecer com a Ir. Genarina. Foi a partir daí, que disse: sim, eu quero ser Irmã. Devo o início de minha vocação a ela. O seu modo de ser e de amar as crianças que me fez apóstola. Depois que entrei no aspirantado nunca mais a vi ou falei com ela. Só sei que uma vez veio a Curitiba, foi me visitar no Colégio Sagrado, mas eu estava na Faculdade de Palmas e não pude vê-la. Hoje vejo Ir. Genarina como missionária e Apóstola autêntica (Pronunciamento de Ir. Neuza Maria Ferreira em 1994). Ir. Genarina era de estatura média, clara, rosada. Rezava muito. Era quieta e silenciosa (Pronunciamento da Comunidade de Nova Esperança).
Ir. Delurdes Vendramin –Convivi com a Ir.Genarina na Comunidade da Santa Casa de Araraquara de 1962 a 69. Ela trabalhava como enfermeira pediatra. Além da assistência profissional às crianças, o seu zelo ia além. As crianças maiores ela as preparava para a Primeira Comunhão. Era curiosa a sua tática; mesmo a criança recebendo alta hospitalar, Ir Genarina segurava-a até que ela estivesse em condições de fazer a Primeira Comunhão. A preparação era tão eficiente que ao deixar o hospital, a criança se dispunha em ensinar catecismo em sua. Paróquia e muitos meninos ainda participavam como coroinha auxiliando no Altar. Houve também o aquele que se fez Sacerdote, como foi o caso do menino Batista. Ir. Genarina enfrentou dificuldades por segurar no hospital as crianças com alta; mas ultrapassou a todas. Várias vezes eu a vi na porta da capela com as crianças em fila, ‘in loco’, a Ir. Genarina as ensinava como se comportar no recinto sagrado, ensinava o significado das vestes sacerdotais, o Altar; aproveitava o momento para ensinar também alguma coisa sobre a hierarquia eclesiástica. Ela era italiana e sobressaia pelo zelo no ensino do catecismo. Na Comunidade com as Irmãs, era calma, assídua na observância regular, sempre dona de si mesma, mesmo diante das críticas.
Um dos vocacionados, o Benedito Batista que fez a Primeira comunhão com a Ir. Genarina, saindo do hospital, iniciou aulas de catecismo em sua Paróquia e posteriormente entrou no Seminário, em São Carlos. Aí ele enfrentou muitas dificuldades raciais, e entre outras a suspensão do convite de ordenação. Entretanto superou a prova de fogo, como dizia. O Bispo encaminhou-o para o Seminário do Ipiranga, em são Paulo. Durante os estudos foi enviado às Paróquias para prestar ajuda. Batista era de família pobre, filho do primeiro casamento e teve irmãos também do segundo casamento. Trabalhou de engraxate e como seminarista sempre se dedicou às pessoas mais pobres, seus prediletos. Recolhia os engraxates, dava-lhes alimentação, agasalhos e ensinava boas maneiras. Os meninos sob sua orientação recebiam um cartão de identificação para que não ocorresse desordem em sua profissão de engraxate. Amparava as prostitutas, mães solteiras, meninos de rua; não media esforços para acudir as pessoas. Quando ordenado Padre, foi Cura da Catedral; nas festas de maior destaque era convidado para cantar no coro. Batista faleceu ainda jovem; dedicava-se mais aos outros e esquecia-se de sua saúde.